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Estudante relata negligência policial depois de ataque homofóbico em São Paulo

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Iran Giusti

Segundo Rafael Rodrigues, depois de ser agredido fisicamente na lanchonete Habib´s da rua Augusta no último fim de semana, foi ofendido e negligenciado por funcionários da rede de fast-food e ainda pela polícia civil e militar

Quando saiu de casa no último sábado (9) preparado para se divertir, o estudante Rafael Rodrigues, 25, não esperava que voltaria para casa com uma história de violência e descaso para contar. Caprichou no figurino. Do alto de seu 1,85 de altura, calçou um par de sapatos de salto alto e uma saia e foi a uma festa junto com cinco amigos. Na saída da festa, o grupo decidiu parar para comer na lachonete Habib’s da rua Augusta, na região central de São Paulo. Ali, Rafael conta que foi agredido física e verbalmente por clientes do local.

“Assim que sentamos para comer, um grupo de quatro caras começou a me chamar de viado, mona, monete”, relata Rafael. “Falei bem alto, para que eles ouvissem, que eu não acreditava que ia ter que comer ouvindo esse tipo de coisa.”

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O desabafo entre amigos pareceu suficiente para acalmar os ânimos, até que uma das amigas de Rafael, ao voltar do banheiro, pisou em falso e caiu no chão. “Eles começaram a mexer com ela, perguntar se a ‘bonequinha precisava de um homem para cuidar dela’”, relembra o estudante. Após sucessivas brincadeiras de mau gosto, o grupo de Rafael decidiu ir embora.

Rafael e seus amigos estavam no caixa quando um dos homens, o único negro do outro grupo, se levantou e abusou da amiga dele, passando a mão nela por baixo do vestido. Ela revidou com uma bolsada. Descontrolado, o homem chegou a ameaçar bater nela, mas foi contido pelos amigos.

O rapaz então pediu para que o gerente do restaurante chamasse a polícia, porque ele queria se queixar da agressão sofrida, e alegou estar sofrendo preconceito racial. Rafael se posicionou dizendo que concordava com que polícia fosse chamada, e que assim aproveitaria para denunciar a agressão verbal homofóbica a que foi submetido, e também o assédio sexual sofrido pela amiga.

“Nessa hora, ele se descontrolou e me deu um soco, eu caí para trás. Quando voltei para revidar, me seguraram. Sou grande, com o salto estava maior ainda, tentei ir atrás dele, mas os amigos dele me ameaçaram de morte”, conta.

Busca da ajuda que não veio

“Após a agressão, eu estava sangrando pelo nariz e nenhum funcionário do Habib’s me ajudou, nem com um pano ou um gelo. Eles simplesmente me ignoraram”, afirma Rafael. Procurados pela reportagem para esclarecimento da política de segurança da lanchonete, a empresa não se pronunciou.

O estudante então apelou para o 190, o número da Polícia Militar de São Paulo. Após relatar o ocorrido, foi informado de que, já que agressor havia fugido, não poderia ser enviada uma viatura ao local. Rafael teria de ir até uma delegacia.

“Foi tudo certo até eu explicar que era um crime de homofobia e perguntar se eu teria que ir até algum local específico ou fazer algo diferente do normal. A policial então mudou o tom de voz e com ironia disse: 'É só contar a sua história’. Eu respondi: ‘Eu não sou burro, querida, sei o que tenho que fazer, só quero saber se por ser um caso de homofobia tenho que fazer algo especifico.’”

A policial então mudou o tom. “Depois que eu a chamei automaticamente de ‘querida’, ela falou: ‘Eu não chamei o senhor de burro e não sou sua querida, por motivo de incomunicabilidade estou encerrando o atendimento'”, a seguir indicou que o estudante deveria ir até o 4º Distrito Policial (DP), localizado na Rua Marquês de Paranaguá, a cerca de 2 km do restaurante, e desligou o telefone.

Com o nariz sangrando e ainda na companhia dos amigos, o jovem chegou à tal delegacia, onde foi informado de que esta estava fechada, por se tratar de um fim de semana. Recomendaram que ele fosse até a 78ª DP, na Avenida Estados Unidos, a 3 km do local onde se encontrava.

Rafael relata que na 78 foi prontamente atendido pelo delegado, que disse a ele que outro funcionário iria atendê-lo. “Acho que era hora de troca de turno, cheguei à delegacia as 6 e pouco da manhã, e só fomos atendidos às 8h56; o boletim foi emitido às 9h50. Fizeram a gente esperar quase três horas e, quando nos atenderam, o escrivão deu a entender que minha amiga foi abusada porque usava uma roupa muito curta. Ignoraram grande parte do que a gente falou”, desabafou.

O jovem conta ainda que durante o tempo de espera na delegacia, três policiais integrantes da guarda civil fizeram uma série de comentários sobre a sexualidade de um quarto membro da corporação, que não estava presente. “Eles ficavam falando com desprezo que o outro policial era um viadinho, bichinha, que era gay certeza. Pela forma que eu fui tratado, ficou claro que as pessoas pensam que mulher que usa vestido curto e gay que usa saia merecem apanhar. Tudo que foi feito com a gente que sofreu a violência foi para nos cansar, desestimular, para não ter registro do crime, para que a gente fique cansado e desista."

Justificativas e investigações

A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo informou à reportagem do iG que o caso foi registrado como lesão corporal, injúria e importunação ofensiva ao pudor, e que nenhum DP fecha nos fins de semana, porém, nas delegacias localizadas em áreas de maior demanda existe priorização de atendimento (no caso o 78ºDP), enquanto as de menor demanda funcionam com efetivo reduzido (4º DP) .

A secretaria informou ainda que “O delegado Kleber Antônio Torquato Altale, titular da 1ª Delegacia Seccional, à qual a 78º DP está subordinada, entrará em contato com o denunciante para obter mais detalhes sobre a denúncia (de negligência policial) e orientá-lo sobre os procedimentos para a formalização da queixa. A Polícia Civil esclarece que não admite comportamentos que constranjam a população atendida em suas unidades, independente de qualquer orientação sexual”.

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De acordo com o delegado, as denúncias serão apuradas e, caso seja constatada qualquer irregularidade, ela será encaminhada para a Corregedoria da Polícia Civil para que sejam tomadas as providências cabíveis. Já a Polícia Militar informa que não compactua com o desvio de conduta de seus policiais e esclarece que a queixa pode ser formalizada diretamente na Corregedoria da Polícia Militar, para que o fato seja devidamente apurado pela corporação.

Segundo Phamela Godoy, da área jurídica da Coordenação de Politicas LGBT da cidade de São Paulo (antigo CADS), Rafael deve realizar queixas na ouvidoria da Polícia Militar (responsável pelo atendimento do 190) e da Polícia Civil, responsável pelos Distritos Policiais, alegando negligência policial, o que pode ser feito pela internet.

“Dependendo do rumo da investigação, a corporação militar pode ser processada pela lei 10.948/01, que pune estabelecimentos com advertência, multas e até fechamento de estabelecimentos em casos de homofobia. Já no caso da polícia civil, o processo é feito em relação à delegacia, que é responsável pelos policiais que estão em serviço”, explica Phamela.


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